quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Neocatecumenato e confissão (II)

A conferencista, ao expor a idéia que a Igreja primitiva possuía do Sacramento da Penitência, num primeiro momento, se aproxima do que disse o Papa no Motu Próprio citado, omitindo, porém, um ponto capital que o Papa manteve: a confissão dos pecados.

E assim dizemos que a Igreja primitiva não teve a confissão como a temos hoje, mas que houve a essência do Sacramento da Penitência que é a conversão, o perdão dos pecados” (p. 126).

Kiko vai debochar das pessoas simples, dizendo:

(..) as pessoas pensam que mesmo o confessionário foi inventado por Jesus Cristo” (p. 143).

Mais adiante, todavia, a expositora afirma algo que contraria frontalmente o que o Papa afirmou em seu último Motu Próprio:

“A igreja primitiva considerava os pecados de morte — [o pecado mortal?] — quase que unicamente a apostasia, ou seja, a negação do caminho ou a saída dele, porque o homem durante o Caminho é fraco e cai, mas sem sair do Caminho”(…) Por isso, a Igreja primitiva não pôs o exame de consciência no final do dia, como foi mais tarde introduzido pelos jesuítas, e sim, de manhã, ao levantar-se, porque converter-se é se colocar diante de deus quando se começa a caminhar” (p. 128).
Os cristãos da Igreja primitiva corriam o risco de morrer na arena, caso não apostatassem. Era natural então que essa fosse a sua grande prova, a sua grande tentação: a de apostatar. Isso lhes era um risco maior do que qualquer outro pecado, daí ressaltarem a importância desse problema. Mas isso não significa que os cristãos das catacumbas considerassem o adultério, por exemplo, um pecado leve.

Carmem sustenta que a Igreja primitiva tinha uma noção de pecado totalmente diversa da atual, e por isso sua concepção do Sacramento da penitência tinha que ser necessariamente diversa.

“A Igreja primitiva considerava os pecados que não significavam sair do caminho – [todos os pecados, fora a apostasia] — como frutos da fraqueza humana, como próprios de um homem que está a caminho para a plenitude que não tem ainda, mas pela qual já se sente atraído, porque tem a certeza dela, porque é testemunha da santidade de Deus, que é absoluta. Na Igreja primitiva, com este conceito de pecado, era muito difícil que os batizados entrassem novamente em pecado; por isso a Igreja primitiva não tem nenhuma explicitação do Sacramento da Penitência que não seja o Batismo” (p. 128).
A líder neocatecumenal começou afirmando que a Igreja primitiva tinha “a essência do Sacramento da Penitência que é a conversão, o perdão dos pecados”. Agora, ela nega que houvesse sequer a explicitação do Sacramento da penitência na Igreja primitiva.

Mais ainda: ela afirma que a moral da Igreja primitiva era diversa da moral posteriormente ensinada e exigida pela Igreja. A Igreja primitiva teria outra noção de pecado mortal. Para ela, pecado mortal era só a apostasia.

Influenciada pelas doutrinas anticonstantinianas e modernistas do padre Louis Bouyer, e fiel a seu conceito historicista e evolucionista, Carmem vai repetir os ataques à Igreja institucionalizada, que teria surgido com a libertação da Igreja pelo Imperador Constantino.

Vocês devem explicar um pouco como com Constantino entraram na Igreja as massas, perdendo-se nela um pouco o sentido a comunidade. Não se vê mais uma comunidade que caminha em constante conversão pelos impulsos do Espírito Santo. Vemos, sim, pessoas que pecam individualmente, que são absolvidas individualmente, e, em seguida, vão comungar… Mas toda uma comunidade em conversão, que se reconhece pecadora, não a vemos” (p. 145).

“Depois, com coisas muito graves como o homicídio e, o adultério público, que eram considerados de morte – [pecados mortais] — quando a Igreja se institucionaliza um pouco, aparece a instituição penitencial” (p. 128-129).
Carmem opõe duas igrejas: uma igreja sacramental e uma igreja jurídica. Para ela, a Igreja primitiva era sacramental, não jurídica, carismática. Com Constantino, a Igreja se institucionalizou e se tornou jurídica. Daí a noção de culpa teria se tornado legalista e moralista. Pecado seria, desde então, uma violação da lei, exigindo uma punição legal.

“Na igreja primitiva, a primeira explicitação daquilo eu podemos chamar de Sacramento da Penitência para os batizados que, depois de terem seguido o Caminho o abandonam, é a excomunhão, porque a Igreja não é uma coisa jurídica, mas sacramental. Não se pode compreender a Penitência sem uma noção sacramental da Igreja. Se passarmos para uma visão jurídica da Igreja, como acontecerá depois, a penitência adquirirá, também ela uma dimensão jurídica” (p. 129).
Toda essa concepção é absolutamente gratuita, sem ter qualquer correspondência com a realidade. Por exemplo, Deus, no Sinai, deu uma lei. Impôs os dez mandamentos ao povo eleito. Seria essa uma noção carismática ou legalista e jurídica?

E Carmem – que dá absoluta importância à noção da Páscoa judaica, dizendo que é ela que subjaz à Eucaristia católica –, Carmem não poderá deixar de reconhecer que esta é uma noção jurídica.

Por que ela prefere, na Penitência, uma noção não jurídica? Por que essa diferença entre a Eucaristia e Penitência em sua relação com o judaísmo?

Mistério…

Continua...

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Neocatecumenato e confissão (I)

É à luz do documento pontifício de João Paulo II, Misericordia Dei, que analisaremos o que se ensina aos membros do neocatecumenato sobre o Sacramento da Penitência ou Confissão.


Para isso, nos fundaremos na Apostila de Kiko e Carmem intitulada “Orientações às Equipes de Catequistas para a Fase de Conversão” — Anotações tiradas das gravações dos encontros realizados por Kiko e Carmem, para orientarem as equipes de Catequistas de Madrid, em fevereiro de 1972 — Jundiaí SP — janeiro de 1987 (quando citarmos esse documento produzido por Carmem Hernandes, daremos, entre parênteses, a página da citação feita).

No 9.o Dia desse encontro, a dirigente do neocatecumenato chamada Carmem fez uma exposição sobre o Sacramento da Penitência, na qual são abundantes graves erros doutrinários.

Dessa exposição é que faremos um resumo crítico.

Antes de tudo, convém salientar que a catequista-mor oficial do neocatecumenato, Carmem Hernandes, desde a sua primeira frase recomenda que não se conte a outros o que ela vai dizer: 

Não é para falarem às pessoas tudo o que eu direi, mas que fique como um pano de fundo, como base e possa servir-lhes para resolver os milhões de problemas que poderão se apresentar com as pessoas. Servirá para evitar complicações, porque o questionário sobre a Penitência se presta a muitas discussões com as pessoas” (p. 124).

É evidente, por essa frase inicial de Carmem, que os seus ouvintes se sentiram lisonjeados pela confiança neles demonstrada: sentem-se “da casa”, iniciados nos segredos do neocatecumenato. Estão já separados e distinguidos da plebe vil, que não terá direito de saber tudo.

Dir-se-á que essa frase tem apenas uma finalidade didática, visando aconselhar futuros “mestres”– os catequistas — como operar melhor.

Mas ela é também uma garantia de manutenção de uma certa reserva, de uma certa discreção. Entra-se num “segredo”. E quem é convidado a ouvir algo reservado, sente que é digno de confiança.

Em troca, tal ouvinte fica disposto a retribuir essa confiança particular, mantendo o “segredo”.

Carmem, entretanto, deixa brumosa a razão do “segredo”…

Ao encerrar a sua exposição sobre o Sacramento da Penitência, ela reitera o pedido de reserva ou de segredo:
Não digam nada às pessoas de todas estas coisas; simplesmente revalorizem o valor comunitário do pecado, sua índole social, o poder da Igreja, etc” (p.137. O negrito é meu).

O fato de, ao final de sua palestra, ela ter reforçado o tom de segredo fica patente, pois que ela diz que os seus ouvintes nada devem dizer do que ouviram. A conferência de Carmem devia ser mantida secreta.

Por que o segredo?
Porque ela tem consciência de que a doutrina que expõe é contrária a tudo o que a Igreja sempre ensinou, e que os católicos em geral conhecem. O segredo do neocatecumenato provém da consciência que seus dirigentes têm de que pregam uma doutrina que não é a católica.

Seria preciso mostrar o baixo nível de expressão de Carmem, que afirma ser necessário que seus ouvintes “revalorizarem (…) o valor comunitário do pecado“?

Revalorizar o valor?
E por acaso o pecado tem um “valor comunitário”?
O pecado não tem nenhum valor.

O primeiro ponto doutrinário a ressaltar no discurso de Carmem é a sua concepção evolutiva da Fé e dos Sacramentos. Diz ela:

“A concepção do Sacramento da Penitência evoluirá de acordo com o que as pessoas vão vendo nele”
(p. 124).

A concepção que a Igreja tem dos Sacramentos é objetiva, e todos os católicos são obrigados a aceitá-la.
A noção que Carmem expõe nessa frase peca por evolucionismo e por subjetivismo. Por ela se creria que a noção de Sacramento varia ao sabor da evolução da concepção que o ‘público” tem dele.

Alguém poderia tentar socorrer Carmem dizendo que no Motu Próprio Misericordia Dei o Papa João Paulo II fala também em evolução do sacramento.

Para facilitar o cotejo, repetimos a citação do Papa, já feita:

“A celebração do sacramento da Penitência conheceu, ao longo dos séculos, uma evolução com diversas formas expressivas”, ela sempre conservou “a mesma estrutura fundamental que compreende necessariamente, além da participação do ministro — só um Bispo ou um presbítero, que julga e absolve, cura e sara em nome de Cristo —, os atos do penitente: a contrição, a confissão e a satisfação”.

Note-se que o Papa afirma que houve uma evolução nas formas expressivas da celebração do sacramento, mas que a Igreja “conservou a mesma estrutura fundamental do sacramento”, que compreende:

1.o) a ação de um ministro que julga e absolve;
2.o) a ação do penitente que inclui a contrição, a confissão e a satisfação.

Nessa estrutura nada pode mudar e a Igreja sempre a conservou assim, diz o Papa.
Para Carmem, o que evolui conforme “o que as pessoas vão vendo” no Sacramento da Penitência é a concepção” dele. O que é bem diferente do que disse o Papa.

É essa concepção evolutiva da fé, dos dogmas e dos sacramentos que faz do neocatecumenato um movimento herético modernista.

Toda exposição de Carmem vai ser guiada por essa compreensão evolutiva da Fé, da Igreja e dos Sacramentos.

Continua...
Fonte